O ABANDONO DE MULHERES NO CÁRCERE E A DISTÂNCIA DA EMANCIPAÇÃO FEMININA

Gabriel Benedito Issaac Chalita, Célia Regina Nilander de Sousa

Resumo


THE ABANDONMENT OF WOMEN IN PRISON AND THE DISTANCE OF FEMALE EMANCIPATION

ÁREA(S): filosofia do Direito; direito penal; direitos humanos.

RESUMO: O objetivo deste trabalho é compreender como a cultura social de menosprezo à mulher “criminosa” contribui para a ausência de visitas dos próprios familiares no cárcere, potencializando o processo de exclusão e a crise identitária das detentas. Por outro lado, o abandono estatal também contribui, de forma implacável, com o estigma da prisioneira, pois o constante crescimento do número de mulheres presas e as condições precárias de aprisionamento são armas potentes para excluir e inviabilizar a reinserção social da mulher “criminosa”. As consequências dessa exclusão acentuam cada vez mais a desigualdade de gênero, aumentando ainda o patriarcado existente, maximizando as relações de dominação dos homens em relação às mulheres. Nossa hipótese é a de que a dominação masculina e a desigualdade social existente na sociedade são mantidas no cárcere feminino. A investigação desenvolvida aqui objetiva responder à seguinte pergunta: as políticas públicas adotadas no cárcere feminino buscam a reinserção social da mulher encarcerada ou ratificam a desigualdade de gênero e o sentimento de menosprezo pela mulher encarcerada que culminam com sua exclusão e invisibilidade social? A metodologia aplicada é a histórico-dialética, pois as contradições existentes entre as relações sociais brasileiras e as políticas públicas de reinserção social das mulheres presas dão conta de que a emancipação social da mulher é um ideal ainda longe da nossa realidade.

ABSTRACT: The aim of this paper is to understand how the social culture of contempt for the “criminal” woman contributes to the absence of visits by their own relatives in prison, enhancing the process of exclusion and identity crisis of the detainees. On the other hand, state abandonment also relentlessly contributes to the prisoner’s stigma, as the steady growth in the number of women arrested and the precarious conditions of imprisonment are potent weapons to exclude and derail the social reintegration of “criminal” women. The consequences of this exclusion increasingly accentuate gender inequality, further increasing existing patriarchy, maximizing male-female relations of domination. Our hypothesis is that male domination and social inequality in society is maintained in the female prison. The research developed here aims to answer the following question: Do the public policies adopted in female jail seek the social reintegration of incarcerated women or ratify gender inequality and the feeling of contempt for incarcerated women that culminate in their exclusion and social invisibility? The applied methodology is the dialectical-historical, because of the contradictions between the Brazilian social relations and the public policies of social reintegration of women prisoners, they realize that the social emancipation of women is an ideal still far from our reality.

PALAVRAS-CHAVE: mulher encarcerada; gênero; políticas públicas; ressocialização.

KEYWORDS: incarcerated woman; gender; public policies; resocialization.

SUMÁRIO: Introdução; 1 A mulher “criminosa”; 2 O princípio identitário das mulheres no cárcere; 3 A mulher no cárcere: punida pelo Estado e pela família; 4 Punição familiar: a cultura do abandono contra as mulheres; 5 O sistema de justiça criminal criado para homens; 6 Família como base para a ressocialização e as políticas públicas; Conclusão; Referências.

SUMMARY: Introduction; 1 The “criminal” woman; 2 The identity principle of women in prison; 3 Women in prison: punished by the state and the family; 4 Family punishment: the culture of abandonment against women; 5 The criminal justice system created for men; 6 Family as a basis for re-socialization and public policies; Conclusion; References.


Texto completo:

PDF

Referências


ANITUA, Gabriel Inácio. Histórias do pensamento criminológico. Trad. port. Sérgio Lamarão. 1. ed. Rio de Janeiro: Revan, 2008.

BARATTA, Alessandro. Criminologia crítica e crítica do direito penal. 6. ed. Rio de Janeiro: Revan, 2011.

______. O paradigma do gênero da questão criminal a questão humana. In: Criminologia e Feminismo, Porto Alegre: Sulina, 1999.

BRAGA JUNIOR, Walter de Carvalho. Mulheres criminosas: transgressão, violência e repressão na Fortaleza do século XIX. 2018. Tese de doutorado em História Social, Universidade Federal do Ceará, Ceará, 2018.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.

CARVALHO, M. L.; VALENTE, J. G.; ASSIS, S. G.; VASCONCELOS, A. G. G. Perfil dos internos no sistema prisional do Rio de Janeiro: especificidades de gênero no processo de exclusão social. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 11, n. 2, 2016.

COSTA, Elaine Cristina Pimentel. Mulheres, cárcere e mortificação do self. In: Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais eletrônicos), Florianópolis, 2013. Disponível em: . Acesso em: 28 ago. 2020.

COSTA, Jurandy Freire. Ordem médica e norma familiar. 1. ed. Rio de Janeiro: Graal, 2004.

CUNHA, Elizangela Lelis da. Ressocialização: o desafio da educação no sistema prisional feminino. Cad. CEDES [online], v. 30, n. 81, 2010. Disponível em: . Acesso em: 28 ago. 2020.

DEPEN (Departamento Penitenciário Nacional). Levantamento nacional de informações penitenciárias: Infopen mulheres. 2. ed. Brasília: Ministério da Justiça e Segurança Pública, 2018. p. 53. Disponível em: . Acesso em: 9 jun. 2021.

ESPINOZA MAVILA, Olga. A mulher encarcerada em face do poder punitivo. São Paulo: IBCCrim, 2004. (Monografias; 31).

FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir. Trad. Raquel Ramalhete. 36. ed. Rio de Janeiro: Vozes, 2009.

FREUD, Sigmund. Introdução ao narcisismo: ensaio de metapsicologia e outros textos. 9. ed. São Paulo: Cia das Letras, 2010.

GEVEHR, Daniel Luciano; SOUZA, Vera Lucia. As mulheres e a Igreja na Idade Média: misoginia, demonização e caça às bruxas. Revista Acadêmica Licencia&acturas, v. 02, n. 01, jan./jun. 2014.

GOFFMAN, Erving. A representação do eu na vida cotidiana. 11. ed. Petrópolis: Vozes, 2003.

LEAL, Maria do Carmo; AYRES, Barbara Vasques da Silva; ESTEVES PEREIRA, Ana Paula. Nascer na prisão: gestação e parto atrás das grades no Brasil. Disponível em: . Acesso em: 28 ago. 2020.

LOMBROSO, Cesare; FERRERO, Guglielmo. A mulher delinquente: a prostituta e a mulher normal. Trad. Antônio Fontoura Jr. 2. ed. Curitiba: Independently Published, 2017.

MAVILA, Olga Espinoza. A mulher encarcerada em face do poder punitivo. São Paulo: IBCCrim, 2004 (Monografias; 31).

MIOTO, R. C. T. Família e serviço social: contribuições para o debate. Serviço Social e Sociedade, São Paulo: Cortez, v. 55, a. XVIII.

MIYAMOTO, Yumi; KROHLING, Aloísio. Sistema prisional brasileiro sob a perspectiva de gênero: invisibilidade e desigualdade social da mulher encarcerada. Revista Direito, Estado e Sociedade, Rio de Janeiro, n. 40, 22.01.2013.

MUCHEMBLED, Robert. Uma história de violência: do final da Idade Média aos nossos dias. Trad. Luís Filipe Sarmento. Lisboa: Edições 70, 2014.

NOGUEIRA, Carlos Roberto F. Bruxaria e história: as práticas mágicas no Ocidente Cristão. 1. ed. São Paulo: Ática, 1991.

QUEIROZ, Nana. Presos que menstruam. 1. ed. Rio de Janeiro: Record, 2015.

SERAPIONI, Mauro. O papel da família e das redes primárias na reestruturação das políticas sociais. Ciência & Saúde Coletiva, Ceará, 2005.

SHIMIZU, Bruno. Criminologia psicanalítica. O mal-estar e a sociedade punitiva. 1. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2016.

TENÓRIO, Graziele Rosa; ZAGRABIA, Débora Braga. Um estudo bibliográfico sobre o enfoque da família nas políticas públicas de atenção às crianças e adolescentes. Serv. Soc. Rev., Londrina, v. 15, n. 1, jul./dez. 2012.

YOUNG, Jock. A sociedade excludente: exclusão social, criminalidade e diferença na modernidade recente. Trad. port. Renato Aguiar. Rio de Janeiro: Revan, 2002.

ZAFFARONI, Eugênio Raúl. Criminología: aproximación desde un margen. Santa Fé de Bogota: Temis, 1998.


Apontamentos

  • Não há apontamentos.


Direitos autorais 2021 Célia Regina Nilander de Sousa, Gabriel Benedito Issaac Chalita